Iniciando este artigo, vejamos parte da jurisprudência do STJ (PROCESSO, AREsp 2379545, RELATOR(A), Ministra NANCY ANDRIGHI, DATA DA PUBLICAÇÃO, 22/09/2023, que nos informa sobre a aplicação de sobreestadia em nosso país:
“...transporte marítimo -
container - sobreestadia (demurrage ou detention)
- demurrage que tem natureza indenizatória - cobrança possível
independentemente de prévia
ciência - praxe do comércio marítimo internacional adotada pelo Brasil...“
Demurrage and detention são duas cobrança de extrapolação de tempo, ou seja, um custo indenizatório, previstos nos contratos, que ocorrem juntas, porem distintas, numa operação envolvendo contêineres.
A
detention vai ocorrer após a ultrapassagem de tempo acordado à disposição do
exportador ou importador fora do terminal ou porto.
Numa
operação envolvendo contêiner, em relação a tempo operacional, no terminal /
porto e no destinatário, vamos encontrar duas situações de cobranças de taxas
que incorrem não somente para os importadores, mas também pelos exportadores,
ou seja, ultrapassagem do tempo livre, franqueado contratualmente, que ocorrem
quando os contêineres não são recolhidos ou entregues dentro do prazo ao terminal
de contêineres (depot) que opera com o transportador / armador, bem como ficam
aguardando embarque no porto/terminal, e nesse caso temos a ocorrência de duas
situações: container demurrage e container detention.
Free time (tempo livre) é o período acordado/concedido
numa locação para a coleta depois de descarregado num porto ou terminal, sem
cobrança de taxa.
No
caso do contêiner demurrage, trata-se de sobreestadia, é o tempo
que o contêiner fica no terminal / porto depois de descarregado do navio, e
fica armazenado no pátio aguardando a liberação alfandegária, ou desova e
limpeza, e neste caso ao efetuar o contrato será acordada um período livre, ou
seja, um período livre que não haverá cobrança da demurrage, logo, período
livre para a devolução do contêiner. Trata-se de uma taxa que vai ser cobrada
se extrapolar o período livre acordado contratualmente, que normalmente cada
terminal / porto estipula um valor que pode ser progressiva ou não de valores,
ou seja, quanto maior for o atraso maior será a tarifa, e normalmente é cobrado
por dia e com valores diários.
Exemplo: O navio Sunset desembarcou o container
XCDR345678-8 no terminal de Manaus, sendo que o “free time” contratual era de 7
dias, como o container foi retirado pelo recebedor em 5 dias, não houve
cobrança de demurrage.
No
caso do “contêiner detention” (detenção) é o tempo que um
contêiner fica fora do terminal de descarga à disposição do importador /
consignatário da carga, onde existe um tempo livre permitido, que não serão
cobradas taxas de detenção, ou seja, a cobrança somente ocorrerá no caso de
extrapolar o lapso temporal permitido / acordado.
Exemplo: O contêiner CXRG789908-9 foi entregue ao
importador no dia 7/5/2024 e foi reentregue no dia 30/6/2024, sendo que o
período acordado para a devolução era de 20 dias, porém ocorreu detention de 55
dias, e deverão ser cobrados 55-20=35 dias de detenção.
Observação: Nos contratos de transporte de contêineres
existem cláusulas que concedem o tempo de estadia, seja no porto ou terminal,
bem como à disposição do importador ou exportador, pois são fixados dias livres
de cobrança de atrasos, bem como a taxa de sobrestadia, portanto cobranças de
sobreestadia e detenção diferem entre portos e transportadoras, para isto é necessário
verificar qualquer anormalidade que ocorra para não ser penalizado, portanto são
necessário s que no contrato sejam
verificadas as necessidades de cada exportador ou importador quanto a questão
se é suficiente, ou não aplicação, para evitar cobranças de taxas. Por questão
da interligação dessas duas penalidades, ou seja, um período dentro do porto ou
terminal, e o outro fora, quando não retorna ao armador/transportador.
Alerta: é importante observar que segundo Jurisprudência
do STJ – Superior Tribunal de Justiça, em Recurso Repetitivo, Tema 1035, existe
a Tese Jurídica: “A pretensão de cobrança de valores relativos a despesas de
sobreestadias de contêineres (demurrage) previamente estabelecidos em contratos
de transporte marítimo (Unimodal) prescreve em 5 (cinco) anos, a teor do que
dispõe o art. 206, §5º, inciso I, do Código Civil de 2002.
Fundamentação
para a cobrança: Resolução
Normativa nº 18, de 21 de dezembro de 2017, (Alterada
pela Resolução Normativa nº 35-ANTAQ, de 19 de agosto de 2019), (Revogada pela Resolução nº 62-ANTAQ, de 30 de
novembro de 2021).
Art. 19. As regras e os valores de sobreestadia, bem como o
número de dias de livre estadia do contêiner deverão ser disponibilizados até a
confirmação da reserva de praça ao embarcador, ao consignatário, ao
endossatário e ao portador do conhecimento de carga – BL.
Art. 20. O prazo de livre estadia do contêiner
será contado:
I – no embarque, a partir da data de
retirada do(s) contêiner(es) vazio(s) pelo embarcador no local acordado; e
II – no desembarque do(s)
contêiner(es) cheio(s), a partir do dia seguinte após a entrega da carga no
local acordado.
Art. 21. A responsabilidade do usuário,
embarcador ou consignatário pela sobreestadia termina no momento da devida
entrada do contêiner cheio na instalação portuária de embarque, ou com a
devolução do contêiner vazio no local acordado, no estado em que o recebeu,
salvo deteriorações naturais pelo uso regular.
§ 1º Caso o embarcador decida postergar o
embarque do contêiner por qualquer motivo, ou dê causa ao postergamento, a
contagem do prazo da sobreestadia somente se encerrará no momento do efetivo
embarque.
§ 2º A contagem do prazo de livre estadia do
contêiner será suspensa em decorrência de:
I – fato imputável diretamente ao
próprio transportador marítimo, ao proprietário do contêiner, ou ao depósito de
contêineres (depot); ou
II – caso fortuito ou de força maior,
se não houver se responsabilizado por eles expressamente.
§ 3º A contagem da sobreestadia que já tiver
sido iniciada não se suspende na intercorrência de caso fortuito ou força
maior.
§ 4º O transportador marítimo ou o proprietário
do contêiner deverá manter disponível ao embarcador, ao consignatário, ao
endossatário e ao portador do conhecimento de carga – BL, a partir do primeiro
dia de contagem da sobreestadia, enquanto esta durar, a identificação do
contêiner e o valor diário de sobreestadia a ser cobrado.
Como
é contado o período de demurrage e detention: vejamos um exemplo de contagem de sobreestadia: o navio chegou
ao porto de Ilhéus e foi descarregado no dia 16/5/2024, portanto iniciando a
contagem da sobreestadia, o relógio correu e o importador retira o contêiner
em 26/5/2024, considerando que o free time era de 5 dias, portanto o importador
arcou com demurrage de 11-5 = 6 dias, sendo que a taxa diária era de US$ 30.00
o total da sobreestadia foi de US$ 180.00.
Vejamos
outro exemplo: O navio XINLING descarregou um container no dia
23/05/2024, foi realizada a liberação alfandegária e desova sendo entregue no
27/05/2024, considerando que o free time era de 5 dias, 5-5=0, portando não
ocorreu taxa de detenção pois foi devolvido em tempo contratual.
Posicionamento da Justiça: Existem contrapontos quanto a natureza jurídica da sobreestadia, não se trata de cláusula penal, mas sim de indenização pela não devolução do container no prazo contratual, entretanto acredito que já deve estar pacífica, vejamos trecho da decisão conforme Acórdão nº
Registro: 2021.0000966973 de
Apelação Cível nº 4011564-17.2013.8.26.0562, da 24ª Câmara de Direito Privado
do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:
...A “demurrage” não é cláusula penal, pois
tem natureza indenizatória decorrente de descumprimento contratual, a fim de
compensar o proprietário do contêiner por eventuais prejuízos suportados pela
devolução tardia, independentemente de culpa do devedor quanto ao atraso...
Com
base nas explicações acima se chega a conclusão que o free time discrimina o
tempo livre de cobranças de taxas, é gratuito o período, pois esta taxa é
vinculada ao tempo que o container ficou no terminal ou porto, evitando que o
container fique parado por muito tempo impactando a operação do terminal, o que
por outro lado a detention refere-se ao tempo que ficou fora do terminal aos
cuidados do importador ou recebedor, que será aplicada no período que não
retornou no prazo acordado.
Entendo
que a fluidez nas operações de contêineres, em um sistema de entrega das
unidades de contêineres, nada mais é do que é uma garantia de que um incentivo
para agilizar a velocidade nas operações de entrega, bem como incentivar uma
concorrência entre operadores para a diminuição de tempo de sobreestadia, como
também mitigar e evitar disputas que podem gerar claims e processos
indenizatórios.
Estas
duas situações devem ser consideradas como uma regra de interpretação de
cláusulas contratuais que devem ser praticadas pela comunidade internacional
marítima, de forma que sejam orientadoras de práticas e regulamentos, nas
operações de retirada e devolução de contêineres.
É
importante observar que hoje com os sistemas integrados, seja das autoridades,
dos terminais de armazenamento de contêineres, das agências dos armadores e
empresas de Comércio Exterior, a comunicação é imprescindível para a
notificação do trânsito do contêiner desde a sua chegada no porto ou terminal
até o destino de final e vice-versa.
Finalizando
a Demurrage e a Detention assegura operações no desenvolvimento inovador para
os problemas de Shipping.
Apontamentos do autor
Gomes, Carlos Rubens Caminha, Direito Comercial Marítimo,
Editora Rio, 1978.
Sites consultados:
https://processo.stj.jus.br/SCON/
https://nsbs.bg/
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